O corte raso de árvores na Lousã em 2023 - iniciativas legislativas 2025


 Artigo divulgado no jornal PÚBLICO, da autoria de Clara Barata, 


O corte raso de árvores na Lousã em 2023, que chegou a motivar uma queixa-crime contra uma empresa de exploração florestal, com sede em Góis, foi o ponto de partida para dois projetos de lei apresentados nesta quinta-feira na Assembleia da República. O Partido Socialista (PS) propõe reforçar as regras de corte de árvores e harmonizar regimes de contra-ordenações, enquanto o Livre quer estender a proteção atualmente dada ao sobreiro e à azinheira às restantes espécies do género Quercus (carvalhos).


Remover todas ou quase todas as árvores numa determinada área de floresta num único episódio, deixando a zona limpa, é aquilo que é designado por “corte raso”. Em Outubro de 2023, foi dado um alerta de que isso estava a acontecer na serra da Lousã, em zonas protegidas, que integram a Rede Natura 2000 e a Reserva Ecológica Nacional. A empresa que estava a fazer o abate, alegadamente, estaria mesmo a cortar árvores que não eram suas.


“Houve uma petição pública, que teve mais de 18 mil assinaturas e pede várias coisas. A mais importante é uma revisão das leis de corte. Agora, recuperámos o que foi discutido na altura”, explica ao Azul o deputado do PS Miguel Costa Matos, sobre o projeto de lei que o seu partido apresenta esta quinta-feira.


“O Sistema de Ação Integrada de Fogos Rurais, criado na sequência dos incêndios em 2017, prevê no Plano Nacional de Ação a revisão das próprias leis de corte. Mas por vários motivos isso nunca aconteceu”, adianta. O que o PS propõe agora é essa revisão, a propósito do caso da Lousã.


Autorização para cortar

A prevenção dos incêndios florestais, proteção da biodiversidade e “preservação da competitividade da floresta” são os princípios orientadores do projeto de lei. Ao contrário do que hoje acontece, o diploma propõe que passe a ser necessária uma autorização para cortar árvores nas áreas protegidas. “Isto foi um dos problemas identificados na serra da Lousã. Havia um risco de ter havido corte de árvores sem a autorização dos proprietários”, salienta o deputado socialista.


O caso do abate de árvores na Lousã gerou muita polémica e captou a atenção a nível nacional. Motivou uma queixa-crime, apresentada por várias empresas locais, que se consideravam lesadas, tal como a Câmara Municipal da Lousã. O processo acabou por ser arquivado pelo Ministério Público, considerando que não há indícios de qualquer crime. Mas a petição pública instava os políticos a “adotar uma nova política ecológica e florestal que promova a retenção da água, a melhoria da qualidade dos solos, a diversidade das espécies e a regeneração das florestas”.


“Fora das áreas protegidas, continuamos com o atual regime, que é só de comunicação prévia, mas com a uma diferença: quem quer cortar terá de demonstrar que é proprietário ou tem a autorização do proprietário, para evitar a situação que houve na Lousã”, adianta Miguel Costa Matos. Nas áreas protegidas, como as da Rede Natura 2000, o Instituto de Conservação da Natureza (ICNF) “poderá impor condicionantes, tal como se faz nas avaliações de impacto ambiental”, salientou.


É uma resposta ao apelo que consta no texto da petição: “Classificar áreas como Rede Natura 2000 e, por estas terem maioritariamente pinheiro-bravo, fazer tábua rasa da restante vegetação, assim como de todo o coberto vegetal (…), além de negligente é passar a mensagem de que o crime compensa.”


Melhorar cadastro de terras

Entre as condicionantes que o ICNF pode impor está a forma de reflorestação após o abate de árvores. O Chega apresenta também na quinta-feira um projeto de resolução em que recomenda ao Governo que seja lançado um programa nacional de replantação e regeneração ecológica das áreas cortadas em zonas protegidas.


Incentivar os cidadãos a registarem as suas propriedades e melhorar o cadastro de terras, ainda muito deficiente em Portugal, é um dos objetivos desta medida. A Iniciativa Liberal apresenta também um projecto de resolução, em que incentiva o Governo “a tomar medidas urgentes para a finalização do cadastro da propriedade rural”.


A revisão da lei proposta pelo PS, no entanto, prevê que haja um deferimento tácito após 45 dias, se o ICNF não conseguir responder em tempo útil. “É importante não deixar a floresta parada. Também nos preocupa que haja sítios onde o corte demore muito, e é preciso arranjar uma maneira de cortar árvores, porque senão o combustível fica em excesso e é preciso fazer alguma coisa”, devido ao aumento do risco de incêndios florestais, adianta Miguel Costa Matos.


Outro objetivo do projeto do PS é dar aos municípios a capacidade de fiscalizar o abate de árvores em áreas protegidas e harmonizar os vários regimes de sanções que hoje existem. “Temos muita legislação dispersa e não faz sentido, porque existe uma Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais e podemos remeter tudo para lá”, disse o deputado socialista. É proposto ainda uma atualização dos valores das sanções.


Nesta leva de propostas legislativas relacionadas com a floresta e inspiradas na petição sobre o que aconteceu na serra da Lousã, a Iniciativa Liberal recomenda ainda ao Governo a criação de um Código Florestal Simplificado, bem como uma reforma da Agência Portuguesa do Ambiente e do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, em nome da eliminação de burocracia e agilização da tomada de decisões.


Proteger os carvalhos

O Livre, no entanto, tem um projeto de lei que menciona especificamente a diversidade biológica da serra da Lousã e o papel importante que as árvores autóctones, como o carvalho, têm para manter a estabilidade e diversidade dos ecossistemas, regular o ciclo da água, proteger contra a erosão e os efeitos das alterações climáticas. Propõe, por isso, que a proteção legal hoje garantida ao sobreiro e à azinheira seja alargada às várias espécies de carvalhos presentes em Portugal.


Propõe, ainda, que o Governo ponha em prática “o mais rapidamente possível o Plano de Gestão da Serra da Lousã, de forma a garantir a conservação dos habitats e espécies protegidas”, e avalie tecnicamente a “eliminação definitiva da possibilidade de se realizarem cortes rasos em áreas classificadas”.


Data: 3-07-2025



Fontes/Links:

https://www.publico.pt/2025/07/03/azul/noticia/corte-arvores-serra-lousa-inspira-projectos-partidos-apertar-regras-2138604

https://www.publico.pt/2023/10/21/azul/noticia/madeira-serra-lousa-historia-cicatriz-sete-hectares-2067317

https://www.publico.pt/2025/06/06/azul/noticia/biologos-lancam-peticao-lei-proteja-carvalhos-portugal-2135852

Outros Links:

https://vaqueirinhoampv.blogspot.com/p/este-blog-os-cortes-rasos-e.html

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